...FOTOGRAFIA...CINEMA...QUADRINHOS...
...INFORMÁTICA...POESIA...LITERATURA...
...FILOSOFIA...ARTE...SEMIÓTICA...CAOS...
Concepção e
sistematização de fotos, poemas e textos; todos realizados em momentos diferentes e
muitas vezes com entre telecinéticos ou um quebra-cabeças, onde as peças juntaram-se com uma
dinâmica própria
(no período de 1990 a 1994).
Trabalhava inicialmente em duas frentes: uma
era a realização (que não abandonei) de uma fotonovela que explorasse
todas as potencialidades da minha linguagem fotográfica, dos computadores e dos
quadrinhos contemporâneos. E outra que apontava na direção de um livro que naquele momento seguia um
"padrão". Os elementos que
possibilitaram COLAGENS só surgiram aos meus olhos quando concentrei as pesquisas nos
movimentos artísticos de vanguarda (principalmente dos anos 60,70,80), mais especificamente na "poesia
visual", na literatura e na Computação Gráfica, ao mesmo tempo que me introduzia na discussão do
"Pós-Moderno" e da "Teoria do Caos".
A "Obra de Arte" sempre foi
oscilante, ou na busca do real e da verdade ou na fuga destes. Vivemos a conclusão
de um ciclo: a descoberta da fotografia e as modificações que esta possibilitou/provocou
em toda a estrutura cultural/visual da humanidade nos dois últimos séculos.Chegamos à representação da
imagem e semelhança do real,
ou melhor, capturamos a imagem do objeto no tempo! Com a imagem digital, transcenderemos o
objeto e toda a sua noção fotográfica de espaço/tempo. Estamos no ápice de uma busca que intensificou-se
com os iluministas, entramos em um novo ciclo (com o fim deste "projeto ilumimista"), marcado pela
"transcendência" e pelo retorno ao lúdico e ao mítico.
Montamos uma grande aldeia global, era o
que nos alertava Mcluhan: as mudancas são tantas e tão profundas, que ainda não as percebemos. As imagens digitais possibilitaram o infinito... Ao
subjetivo a desconstrução do real, assim como os computadores possibilitaram a matemáticos como Mandelbrot destruirem o
domínio da verdade absoluta e da razão cristã-ocidental. O humano não cabe em todos os "ismos"
juntos. Cientistas não mais podem isolar seus objetos de estudo. O acaso e o infinito não são fáceis de serem
aceitos...Utopia:¶
Deus não cabe mais em nossas mentes, como um
sino, um tribunal ou um salvador! Somos provadores da árvore da vida, da árvore do bem e do mal. Viventes/insignificantes/fundamentais no universo. A
mente produz energia, que é dissipada ou não! Este é o sentido profundo da existência. Transcendemos os
determinismos e as certezas, somos engrenagens do caos...O eterno retorno em forma de espiral...
Nietzsche já afirmava: Deus está morto!
Fomos colocados diante de um espelho caleidoscópico, onde nossa imagem em grayscale confunde-se com a de arquétipos-vudus. Um ser/civilização em
extinção/evolução.
Vivemos um momento crucial na terceira
revolução industrial, ao mesmo tempo que a tecnologia e a comunicação
tornam-se elementares, temos a dissimulação de uma cultura, onde a convivência com a
diversidade, afirma-se como a convivência do EU com o símbolo, o signo, a imagem, a representação.
COLAGENS experimenta, provoca, destrói, abre
possibilidades... Seu objetivo centra-se na própria obra, ou seja, apropria-se do leitor e de tudo que seja necessário para a feitura da trama.
Tomando a premissa de Mário de Andrade:
"em verdade, sempre será conto aquilo que seu autor batizou com o nome de conto". COLAGENS não aproxima-se de outro gênero que o melhor defina
do que o conto,
mesmo que não seja um texto curto, enxuto e sua unidade de efeito esteja propositadamente
diluída em cada página. O sentido do roteiro não está em um início-meio-fim (apesar de contê-los), mas
simplesmente num desenrolar de cenas que poderiam mudar de ordem ou serem lidas isoladamente, sem alterar o sentido de cada
página.
Pode ser uma "coletânea de contos" que formam um conto maior (pois lhe falta a
trama de uma novela ou um filme - em capítulos - ou um romance). Em cada página é proposta uma Epifania
(mesmo que não tenha alcançado este propósito plenamente), seria assim como concebeu Joyce: apreender o
objeto (no caso releituras) e devolvê-los ao leitor, explorando ao máximo sua visualidade e significância.
A utilização de um personagem central, sem
rosto, nome ou perfil definido, coloca-se dentro do propósito de retratar
os fragmentos mentais e autobiográficos de um chip-biológico-esquizofrênico. Na verdade
são como fragmentos de um diário ou de um story-board que se perdem entre o relato e os acontecimentos, entre
o real e o imaginário, diluindo qualquer noção de espaço-tempo (o texto usa as reticências para expressar
estes fragmentos de pensamento).
Um visionário, um cavaleiro onírico, que
vaga no seu existir... Em busca de algo que ele não sabe ao certo o que seja.
A solidão é encarada como o habitat de um perdido entre coisas ao seu redor (que parecem
construir a sua identidade).Um descrente de qualquer ideologia ou religião, colocado diante da vida, do caos e da
morte.
Não trata-se de um esquizofrênico no sentido
de um doente (apesar de possuir alguns dos sintomas: hebefrênico, catatônico e paranóide), mas no sentido dado por Hassan quando traça uma diferença
entre modernidade (neurose) e pós-modernidade (esquizofrenia).
O desencadear da trama é mais um elemento de
colagem, ou melhor, são colagens que unem-se à várias outras colagens
em um conto que ao assumir-se pós-moderno, não faz apologia de uma moda ou sua defesa
incondicional, mas pretende desmistificar, abrir uma discussão que só vem a enriquecer. Portanto, não apenas pela
estrutura visual e colada do texto em seus vários aspectos, ou pelas reações do personagem central, nem pelo fato de
trabalhar com os computadores que trato-o como um conto pós-moderno.
Torna-se importante frisar que o pós-moderno
é algo tão recente que constitui-se (tem isto como característica) uma manifestação disforme e essencialmente plural, ou seja, seria melhor falarmos dos
vários pós-modernismos, das várias proposições que colocam-se como sintomas de uma pós-modernidade e não como
representantes desta.
Situo-me dentro deste contexto, onde a riqueza de linguagens e tecnologias nos coloca num
patamar privilegiado para inúmeras experimentações no campo da arte e da vida.
Quando vivenciamos o "eu", somos
capazes de perceber o "outro" e conceber o "plural", o
"infinito"... Talvez seja este o melhor legado que pode nos deixar o pós-moderno.
As fotografias de COLAGENS são um pouco
consequência de todo este período. Foi exatamente na pesquisa, no experimentar e na edição fotográfica que concentrei a maior parte do meu tempo.
Umberto Eco, no seu ensaio "Sobre os
Espelhos", fala da prótese como uma extensão do próprio corpo, ou seja,
algo capaz de "aumentar" o raio de ação de um órgão ou sentido. Percebemos
que Roland Barthes já havia nos falado algo sobre este "sentimento" que envolve o fotografar e da utilização dos
vários sentidos do fotógrafo neste processo. Seriam, então, as máquinas fotográficas, próteses privilegiadas, capazes de construir
um "signo", uma linguagem semiótica tão específica e complexa quanto a fala, a escrita, etc.
A utilização da fotografia e da imagem/signo
não apenas para "ilustrar", mas para escrever e contar. Foi este um
dos elementos primordiais que levei em conta para a seleção das imagens.
Procurei reduzir ao máximo a presença do
laboratório. Privilegiando as fotos, seja no seu instante fotográfico ou
na edição/intervenção em computador. Através do chamado "sistema híbrido",
que consiste na digitalização de fotografias em papel, através de um Scanner.
O computador utilizado foi um 486 DX 50 (puro)
placa de local-Bus, dois Winchesters de 300MB, 20MB de RAM, tela SVGA, Kit Multimídia, Scanner de mesa de 600DPI e uma impressora Laser de 300DPI com
expansão de memória. Os programas básicos foram: WINDOWS WORK-GROUPS 3.11 e DOS 6.0; Corel Draw 4.0 ( todos os
seus programas), Picture Publisher 3.1 e Page Maker 4.0 (no período de dez./93 a julho/94).
Vital para a viabilidade do livro COLAGENS, o
computador foi útil primeiro devido aos recursos de manipulacão fotográfica: através de retoques, filtros, etc. Ou ainda com a utilização de fractais
e até combinações de fractais (em forma de mapas de textura). Segundo pela liberdade que estes recursos deram para a
adequação do roteiro geral às estruturas de cada página, cada sequência, cada cena. Consequentemente,
dotando COLAGENS de "um todo", constituído de um corpo uniforme e
equilibrado.
Tratava-se também de dar um caráter de
"zine", de uma obra reproduzível em xerox, um panfleto-pop, herdeiro dos experimentos e revoluções que a criação e produção artística
enfrentam. Uma carta despudorada de intenções com o caos.
Henrique José
Natal/RN - Domingo, 21 de agosto de 1994. |