Comitê
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Repressores
RN
Militantes Reprimidos no Rio Grande do Norte
Mailde Pinto Ferreira Galvão
Livros
e Publicações
1964.
Aconteceu em Abril
Mailde Pinto Galvão
Edições Clima
1994
2
de Abril: Prisão do Prefeito
Iniciamos
o dia seguinte tentando conviver com a difícil
realidade da ditadura militar. “O
Diário de Natal” divulgava,
em primeira página, as notícias
da consumação do golpe com
as seguintes manchetes e notícias:
“CONGRESSO DECLAROU
CARGO DE PRESIDENTE VAGO – MAZZILI
INVESTIDO HOJE: PRESIDÊNCIA.
O Senhor Ranieri Mazzili foi investido,
na madrugada de hoje, nas funções
de Presidente da República...”
“JANGO DEIXOU O PAÍS
COM A FAMÍLIA.
As informações conhecidas
agora indicam que o Sr. João
Goulart, destituído do poder
pelas forças armadas, pela madrugada,
via aérea deixou o país,
acompanhado dos seus familiares.”
“ARRAES TEVE IMPEACHMENT
DECRETADO PELA ASSEMBLEIA
Ontem, pelas dez horas da manhã,
as autoridades militares resolveram
o afastamento do governador Miguel Arraes,
do cargo, por considerá-lo sem
condições de continuar
à frente do executivo pernambucano.
“ARRAES.
Foi deposto pelo Exército e,
logo depois, demitido.
“EXÉRCITO DOMINA
COMPLETAMENTE A SITUAÇÃO
NESTA CAPITAL QUE É DE COMPLETA
CALMA.”
Em outra página o mesmo jornal divulgava
a invasão da Prefeitura, ocorrida
na noite anterior, com a seguinte manchete
e notícia:
“QUARTEL DA LEGALIDADE
FECHADO PELO EXÉRCITO.
Cerca de 21 horas de ontem, uma patrulha
do Exército ocupou as dependências
da Prefeitura, dissolvendo a reunião
política que ali se realizava.
Como se sabe, o prefeito Djalma Maranhão,
desde as primeiras horas de ontem anunciou
a instalação do quartel-general
da legalidade.
“A notícia concluía
informando que:
“A Prefeitura poderia voltar às
atividades administrativas normais,
não sendo permitidas, no entanto,
qualquer reunião de caráter
político.”
“OCUPADO O DCE PELAS TROPAS
DO EXÉRCITO”
No mesmo jornal estava publicada a Nota
Oficial do Governador do Estado, com
a sua definição pelo novo
regime.
“GOVERNO
DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
O governador do Rio Grande do Norte,
agora informado das razões e
objetivos do movimento ontem deflagrado
sob a liderança do governador
Magalhães Pinto, quer manifestar
o seu apoio aos ideais dessa posição
que visa a autêntica legalidade
democrática realmente ameaçada
por atitudes fatos que não eram
ainda do conhecimento público.
Lamenta que o presidente João
Goulart, a quem reconhece e sempre há
de proclamar inestimáveis serviços
ao Rio Grande do Norte, no plano do
seu desenvolvimento econômico-social,
além de uma luta áspera
por modificar estruturas que precisam
ser urgente e profundamente reformadas
para atender aos anseios do progresso
nacional, não tenha pedido impedir
a radicalização das posições
ideológicas e políticas,
conduzindo o país ao impasse
intolerável que só pode
ser solucionado com o respeito às
tradições das forças
armadas, o restabelecimento da tranquilidade
e da paz, cujos anseios estão
sendo interpretadas pela firme e corajosa
atitude do governador de Minas.
O governador do Estado pede ao povo
que fique tranquilo e confie no esforço
que fará pra resguardar os melhores
interesses do Rio Grande do Norte e
da democracia.
Aluízio Alves
A nota demonstrava a indecisão do
governador enquanto aguardava a definição
da crise no sul do país. Após
decidir-se, e assumindo a liderança
civil da ditadura no Estado, Aluízio
Alves afastou, do primeiro plano dos acontecimentos,
o udenista e participante do movimento militar,
Senador Dinarte Mariz, seu adversário
político.
Apesar da violenta invasão da Prefeitura
e da confirmação da vitória
das forças militares e prisão
do governador de Pernambuco, Sr. Miguel
Arraes, o prefeito chegou logo cedo, na
manhã do dia 2, para o expediente
de trabalho que seria o último de
seu mandato. Nós, da equipe, comparecemos
normalmente aos locais de trabalho. Esperávamos
ainda continuar aquela administração
que tivera início com a eleição,
por esmagadora maioria eleitoral, de um
homem do povo que executava um programa
de alfabetização e democratização
da cultura em todos os bairros da cidade,
inspirado no nacionalismo que defendia.
Nosso expediente foi, no entanto, encerrado
às 17 horas, com a prisão
do prefeito e vice. Diante do quadro político,
Djalma Maranhão devia sentir que
a sua prisão poderia ser efetuada
a qualquer momento.
Pela manhã, a Prefeitura não
recebeu fluxo normal de pessoas à
procura do prefeito. Apenas os funcionários
movimentavam-se pelos diversos setores de
trabalho.
À tarde as salas estavam vazias,
poucos servidores voltaram ao expediente
e o prefeito permanecia sozinho em seu gabinete.
Pelas 15 horas, os auxiliares Flávio
Cláudio Siminéa e Carlos Lima
apresentaram-se ao prefeito e tentaram permanecer
a seu lado, sob qualquer pretexto. Djalma
seguramente não queria companhia;
dispensou-os com atribuições
para executarem fora da Prefeitura.
Carlos Lima foi o último a se retirar;
tentou ficar e conversar sobre os noticiários
dos jornais mas Djalma ordenou que saísse.
Quis permanecer só e sozinho estava
quando, minutos depois, os militares vieram
prendê-lo.
Não consegui testemunhas do momento
em que foi efetuada a prisão, apenas
dois funcionários viram o prefeito
descer a escada de saída para a rua,
escoltado por oficiais do Exército.
Em baixo, na rua, ficou o carro de uso oficial
do prefeito, com os quatro pneus esvaziados
pelos militares.
O prefeito foi conduzido ao Quartel-General
do Exército, àquele tempo
localizado na praça André
de Albuquerque, e levado à presença
do coronel Mendonça Lima. O encontro
dos dois foi divulgado por um documento
escrito posteriormente pelo próprio
Djalma Maranhão. O coronel lhe propôs
que renunciasse ao cargo de prefeito e,
troca, teria assegurada a liberdade. O prefeito
recusou em nome da honra e do povo que o
elegeu; foi, então, levado preso,
incomunicável, para uma cela do quartel
do 16° RI.
O coronel Mendonça Lima a pedido
do prefeito, deu permissão para que
passasse antes em sua residência.
Na mesma tarde foi igualmente, preso o vice-prefeito
Luiz Gonzaga dos Santos sem, no entanto,
ser-lhe oferecida a possibilidade da renúncia.
A prisão do prefeito e vice, em pleno
expediente de trabalho, foi a consumação
da violência contra os direitos humanos
e contra a democracia, executada pela ditadura
militar no Rio Grande do Norte.
Informada sobre as prisões, dirigi-me
à sede da Prefeitura, num último
gesto de busca dos companheiros e dos nossos
projetos de luta administrativa e social.
A rua Ulisses Caldas encontrava-se quase
deserta e calma naquele fim de tarde. Nada
indicava que fora palco de um acontecimento
grave que feria o direito à liberdade
e à democracia.
No salão nobre da Prefeitura, um
funcionário fechava portas e janelas.
O gabinete do prefeito encontrava-se aberto,
vazio, em quase penumbra.
A partir daquela tarde, a caça aos
considerados subversivos foi desencadeada
com o aparato militar semelhante aos vistos
nos filmes que mostram a perseguição
nazista.
Para efetuar a prisão de uma pessoa
indefesa e amedrontada, isolavam todo um
quarteirão, invadiam as residências
armados com fuzis e metralhadoras, revistavam
todas as dependências, especialmente
as bibliotecas, onde apreendiam os livros
de acordo com o título. O “subversivo”
era, então, detido e levado sem explicações
à família, que teria de sair
procurando localiza-lo nos quartéis.
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