Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
As Dunas Vermelhas Romance em tempo de Rebelião
Nei Leandro de Castro
Na noite de 23 de novembro de 1935, alguns soldados do 21º Batalhão de Caçadores, sediado em Natal, tomaram o quartel onde serviam.
Dali, junto com rebeldes civis, sob orientação do Partido Comunista, partiram para a tomada do poder constituído. Assaltaram o quartel da Polícia Militar, que caiu após 17 horas de intenso tiroteio.
O governador Rafael Fernandes e outras autoridades refugiaram-se na residência do cônsul da Itália e não ofereceram a menor resistência.
Logo, estava consolidada a insurreição, a primeira de cunho marxista do continente americano.
A rebelião durou apenas 82 horas, por falta de estrutura, apoio popular e falha na conexão que previa levantes em vários estados brasileiros.
Chamado pejorativamente de Intentona Comunista, o episódio é muito pouco estudado além das fronteiras do RN.
Nei Leandro de Castro utiliza a insurreição natalense como pano de fundo para este romance, "As dunas vermelhas".
Os fatos históricos são respeitados, personagens reais comparecem com seus nomes verdadeiros, mas não se trata propriamente de um romance histórico.
Em essência, tramas de amor, traição, humor e crimes passionais prevalecem sobre o que ocorreu naqueles dias de novembro de 1935.
As dunas vermelhas de Natal
Por Moacy Cirne*
Nei Leandro de Castro, nascido em 1940, muito provavelmente é o maior escritor contemporâneo do Rio Grande do Norte. Autor de pelo menos dois livros antológicos de poesia (Era uma vez Eros, 1993, e Diário íntimo da palavra, 2000) e dois romances primorosos (O dia das moscas, 1983, e As pelejas de Ojuara, 1986), além de um premiado dicionário de Guimarães Rosa (Universo e vocabulário do Grande Sertão, 1970), sem contar com outros livros e contos inéditos, Nei Leandro, embora pouco conhecido no Sul do país, é um nome modelar para se compreender a literatura brasileira da segunda metade do século passado.
Um nome que, em pleno século XXI, continua produzindo com fulgor criativo.
Haja vista o seu mais novo romance: As Dunas Vermelhas [Natal: A.S. Editores, 2004, 232 p.].
Sua escrita, carregada de modernidade, contém todos os elementos que fazem do seu texto um convite aberto à leitura prazerosa, seja pela tessitura romanesca, seja pela construção dos personagens, seja pelo humor envolvente em vários momentos, seja pela própria História que alimenta a narrativa. E não se trata de uma história qualquer. Afinal, a rebelião comunista de Natal, em novembro de 1935, faz parte da saga política natalense do século XX, com seus muitos erros (apesar do idealismo que a gerou), a começar por um fato sintomático: seus líderes mal conheciam as teorias do socialismo revolucionário.
E o que dizer da Natal da época? Com seus (aproximadamente) 36/38 mil habitantes, era uma cidade bastante provinciana. Mas o romance de Nei Leandro não se detém na História enquanto tal, mesmo quando essa mesma História é um elemento significativo para a compreensão de seus meandros romanceados. O livro do autor potiguar, em sendo marcado pela contextualização histórica, existe como um relato fluente, otimamente estruturado e muito bem articulado em suas funções romanescas, quase “cinematográficas” através de capítulos curtos que “animam” e ”movimentam” a leitura.
A ação se passa antes, durante e depois do já citado levante de Natal em 1935, com suas elevadas taxas conteudísticas de política e humor, política e romance, política e mentiraiadas. No melhor estilo de Nei Leandro.
São muitos os personagens que formam a trama de As Dunas Vermelhas, alguns reais, outros imaginários, outros pressentidos. São muitas as tensões dramáticas que alimentam o livro, formando um mosaico narrativo que, extrapolando o que seria um romance histórico, abre-se para situações temáticas centradas em afetos, paixões, dúvidas, questionamentos, traições.
A rigor, na tessitura do enredo, não há conclusões (ou, ao menos, não há conclusões simples): o próprio destino de alguns personagens passa pela imaginação do leitor. Decerto, muitos natalenses ligados à geografia humana da cidade, poderão descobrir fatos, pessoas e desdobramentos históricos que poderão enriquecer o imaginário construído a partir do livro.
Mas a verdade é que um romance bem elaborado não se constrói fácil, assim como não se constrói fácil a boa poesia.
Exige rigor, exige dedicação, exige disciplina. A propósito, as palavras do romancista americano William Faulkner, em célebre entrevista concedida em 1956 a Paris Review, cabem perfeitamente aqui:
“Um escritor precisa de três coisas, experiência, observação e imaginação, sendo que duas dessas, às vezes até mesmo uma, podem suprir a falta das outras”. Se bem que, no caso específico de As Dunas Vermelhas, pode-se dizer que, além da disciplina, Nei Leandro trabalhou com três níveis de elaboração: experiência, pesquisa e imaginação. Sim, a pesquisa histórica terminou sendo da maior relevância para o livro de Nei Leandro de Castro – um livro que já nasceu com as marcas fundantes da grande Literatura.
*Moacy Cirne é escritor e teórico de histórias-em-quadrinhos
Dunas Vermelhas Romance em tempo de Rebelião
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