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Insurreição Comunista de 1935

ÀS ARMAS, CAMARADAS!
A Insurreição Comunista e o Governo Popular de 1935 em Natal
Natanael Sarmento


Guerrilha do Vale do Açu

Nos anos trinta, parte da imprensa brasileira confundia comunistas e cangaceiros. Assim, a guerrilha do sertão potiguar, no Vale do Açu, foi tratada como cangaço. Nos diversos embates, da Polícia Militar com a guerrilha, apesar de constatada a presença de operários, salineiros e ferroviários, de Macau e Mossoró, o conceito não mudava. O comunista Manoel Torquato, foi o líder e organizador da guerrilha rural do Vale. Homem de leituras e convicções políticas, mas, sobretudo, homem de ação. Já participava do PCB quando escapou de ser assassinado em ciladas e tocaias, de fazendeiros e policiais, no Vale do Rio Açu. Quando preso, encontrava uma maneira de fugir, fato que ocorreu duas ou três vezes. Começa a guerrilha e promove confrontos impondo derrotas à polícia. As notícias desses confrontos ecoavam nos jornais de Natal e da Capital Federal. O Ministro da Justiça, requisitou das autoridades potiguares relatório detalhado do banditismo sertanejo, do qual tanto se falava.

Manoel Torquato foi da Igreja dos protestantes, porém trocou a exegese do Testamento pelo Manifesto Comunista. Jovem voluntarioso, não quis esperar pela salvação da alma e decidiu lutar contra os ricos no Vale do Rio Açu50. Desenvolvia intensa atividade de prosélitos subversivos nos povoados e fazendas. Por essa agitação, delato , foi preso e levado à prisão, em Mossoró. Manoel Torquato escapou da prisão em Mossoró, retomou as atividades do proselitismo, mas com a luta armada em andamento. Conhecia aquela região como na palma da mão, nascido e criado nos vales. Na cabeça, o mapa, com cada braço de rio, vereda, os possíveis esconderijos e rotas de fuga. Usou técnicas guerrilheiras dos ataques surpresas típico dos cangaceiros. Com movimentos e deslocamentos rápidos, nada do confronto direto e esperado, da guerra convencional. Nessa pisada, a guerrilha sustentou, por mais de ano, os combates no Sertão. Nos ataques fazia o proselitismo conclamando os camponeses à luta contra a exploração e o monopólio da terra. À guerrilha ele e o PCB arregimentam mais de cem homens. Tantos que foram divididos em pequenos grupos. Sem favor, pode-se afirmar que a revolução camponesa no Brasil do Vale do Açu foi avant ensaio geral senão avant premier da Revolução Nacional Libertadora de 1935. O Partido Comunista Brasileiro, em Mossoró, apoiava, como podia, a guerrilha, seguindo a orientação da direção nacional. O PCB procurava desenvolver o trabalho de organização de células camponesas, tarefa das mais difíceis. No Nordeste, passou a buscar aproximação com os cangaceiros dos Estados do Ceará, Rio Grande , Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia. A estratégia aproximativa resultou em retumbante fracasso. Erro crasso de avaliação dos comunistas brasileiros endossados pela Internacional. Os bando cangaceiros lutava por si . Na estratégia de sobrevivência, do saquear e tomar, matar e espalhar o terror. Bandidos entrelaçados com o coronelismo, místicos, seguidores e adoradores de beatos e padrinhos. Ao lado dos jagunços, mantidos pelos coronéis, os cangaceiros terceirizados, do serviço sujo. O último elo da corrente política de compromisso, coronéis chefes locais e políticos regionais. Em parte alguma do país a estapafúrdia aliança comunista e cangaceiro foi possível. A imprensa, propositadamente, confundia. Desqualificava muito mais tratá-los de cangaceiros, bandidos comuns. Jamais a imprensa oligárquica diria que homens armados estavam em guerra aberta contra o latifúndio. Contudo, foi exatamente o que fizeram Manoel Torquato, no Vale do Açu, Rio Grande do Norte, e Manoel Alves de Campos Góis, no Sertão de Pernambuco. Os dois casos citados são comunistas , orientados e organizados no PCB, que lutam com armas na mão nos campos nordestinos, com as técnicas guerrilheiras dos cangaceiros. Os bandos dos cangaceiros assaltavam, roubavam, pilhavam, queimavam, destruíam, torturavam, impunham terror, por onde passavam. Os comunistas buscavam adesão à revolução agrária, queriam acabar com o maior dos roubos: a propriedade privada da terra, o monopólio latifundiário.

Os responsáveis pela segurança do governo de Rafael Fernandes procuravam, a todo custo, criminalizar a ação da oposição, fosse qual fosse. Acusações genéricas, desprovidas de provas, bastavam para indiciar, processar e prender. Mario Câmara, um interventor de Getúlio, foi acusado de orar pelo credo vermelho. De beneplácito com a subversão da Aliança Nacional Libertadora. Deixar correr frouxo os meetings e disseminar boletins subversivos por todos os quadrantes do Estado.51 A Carta de 34 deprevia a livre organização, direito de reunião, informação e partidária. A polícia potiguar operacionalizada, por João Medeiros e Enoch Garcia, considerava isso omissão criminosa. O interventor devia proibir os meetings, empastelar jornais e queimar os boletins, da Aliança, entenda-se. Estão no posto por vassalagem em relação suserania, para servir ordem e a legalidade partidária do rei . Aos amigos, tudo; aos inimigos, a perseguição, em nome da lei. Havia a aberta intenção dos partidários do Partido Popular Fernandes retirar de cena os indesejáveis opositores, partidários de Café Filho e Mário Câmara. Com esse escopo foram colocados no mesmo saco a serem confundidos com os comunistas. Opositores quais forem, são gente da mesma laia, comunista.

A guerrilha organizada por Manoel Torquato diferia do cangaço como a água do vinho. Na composição social. Nos objetivos. No procedimento com populares, nas vilas e povoados atacados. Diferenciada em forma e conteúdo. Bandidos e bandoleiros, do mundo rural, surgem em todas as latitudes, no mundo atrasado, feudal e do capitalismo tardio. Nas regiões mais distantes das conquistas da civilização, da presença do Estado. Um banditismo com feição social, sem, todavia, conotação política ou ideologia. Esses bandoleiros não lutam contra o governo, contra regimes, para mudar os sistemas de propriedade, muito menos. Lutam para sobreviver, tomar pelas armas, o que podem e como podem, nas condições estabelecidas.

A guerrilha do Vale do Açu foi protagonizada pelos comunistas, camponeses e operários, salineiros, ferroviários, recrutados na luta, com ligação orgânica partidária do PCB em Mossoró. Daí parte a decisão da deflagração da guerrilha, para dar o primeiro passo da marcha revolucionária, por que a revolução Nacional Libertadora estava a caminho.

Manoel Torquato contou com a ajuda teórica do rábula Miguel Moreira, para escrever boletins e comunicados. Nas invasões dos povoados e fazendas, eram distribuídos durante ou após os rápidos discursos. Os guerrilheiros solicitavam e recolhiam donativos. Requisitavam as armas e munições e sumiam com a mesma rapidez com que chegavam. Por vezes, passavam semanas, meses, sem aparição ou comunicação com o Partido.

O PCB estava sedimentado em Mossoró, operários das salinas e da ferrovia e das pequenas fábricas. A segunda maior cidade do Estado, em população, distando da Capital. Quase trezentos quilômetros separam os dois maiores centros urbanos potiguares. O levante em Natal, decidido na tarde do dia 23, não foi comunicado ao partido em Mossoró. Sem preparação, a notícia do levante do 21º BC pega o partido de surpresa. Os comunistas daquela região saberiam da revolução juntamente com a repressão policial, desabada com mão de ferro sobre eles. A brutal repressão, da força pública, que chegava cuspindo fogo para cortar o mal pela raiz. Com a proverbial violência pedagógica da briosa Polícia Militar. A PM, auxiliada pelos jagunços dos coronéis, cai em campo para acabar a canalha extremista. A luta na Várzea do Açu prosseguia, contudo, nos centros urbanos, em cidades como Mossoró e Macau, o Partido seria destroçado, com prisões e debandadas, dos comunistas.

Apesar do cerco policial, a luta camponesa do Açu resistia, no aguardo do desenvolvimento da revolução nacional e libertadora . Mas a tal revolução geral não acontecia e os guerrilheiros de Torquato passavam da inquietação ao desespero. A notícia da derrota da revolução nacional, foi a pá de cal. Os guerrilheiros do Açu estavam isolados, a guerrilha sem possibilidade de permanecer na luta.

Em janeiro de 1936, a guerrilha agonizava, travava os últimos combates. Na fazenda Canto Comprido, a morte do coronel mexeu com os brios da oligarquia governante. Matar jagunços, pobres miseráveis, isso era uma coisa, outra bem diferente era matar fazendeiro. Portanto, o crime cruel e abominável não podia ficar impune. Inadmissível! As folhas da capital e do estado carregavam nas tintas. Ao ponto a que se chegou a insegurança do Rio Grande. A população refém dos assassinos. O sensacionalista brado de indignação ecoava na Assembleia estadual. Deputados revezavam, na tribuna, exaltados. Manoel Torquato ungido a inimigo público número um. Um prêmio pela sua cabeça, uma grossa recompensa oferecida pelas autoridades públicas. Mais verbas e reforços à segurança, deslocamento de tropas para a região do Açu. Aperta-se, ainda mais, o cerco à guerrilha do Vale.

Quem pagou o pato foi o Tião Torquato, pai do Manoel Torquato. O velho foi torturado pela briosa força pública militar para informar o que não sabia, onde se escondia o filho. Morreu esfarrapado, não se diz o que não se sabe, não se retira leite de pedra. Nesse diapasão de repressão, sem limites, a banda da polícia toca, na região, em Mossoró e Macau, adjacências.

Sem apoio das cidades, os guerrilheiros decidem pelo fim da guerrilha. Na dissolução, os destacamentos armados desfazem-se, paulatinamente. Deviam abandonar aos poucos, em pequenos grupos, a não dar na vista. Deviam sair em duplas, no máximo, em grupos de três. Manoel Torquato faria dupla com Feliciano Pereira de Souza, um sujeito ladino que estava no seu grupo. A aventura guerrilheira do Vale do Açu teve epílogo dos mais dramáticos e melancólicos. Depois de mais de ano de lutas e confrontos, dissolvia-se, em completo isolamento, desolação. O seu líder Manoel Torquato foi assassinado pelas costas, morte em dupla traição. Sem chance para se defender, e traída pelo companheiro. O ladino Feliciano Pereira matou covardemente Manoel Torquato para receber a “grossa recompensa” prometida pelo Governo. Final com marcas da traição e da covardia. O assassino jurou lealdade ao líder e à revolução. Não viu futuro, mudou de opinião. O Barão de Itararé, em síntese satírica, desse tipo de deslealdade dos homens, diz: “Os homens são sempre sinceros. O que acontece, porém, é que às vezes trocam de sinceridade”.52

 

 

 

 

 

 

 

 

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