Insurreição
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte
Revolta
Vermelha, A 1935
Hélio Silva, Editora Civilização
Brasileira, 1969
Nosso
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REVOLTA
DE CABOS E SARGENTOS
A DIFÍCIL conjuntura econômica do
Nordeste dava eficaz cobertura às atividades
da ANL. Também a crise política,
constante em todos os Estados na fase de reconstitucionalização,
falava mais eloqüentemente que os caravaneiros
clamando Pão, Terra e Liberdade.
No Rio Grande do Norte realizara-se uma campanha
violenta em torno da eleição indireta
do governador. Presidira o pleito, como interventor,
Mário Câmara, que denunciara a Vargas,
muitos meses antes o perigo da rebelião.
Procurava eleger-se e contava com a simpatia do
Presidente. Combatido, pelos elementos tradicionais
da política local, chefiados por José
Augusto Bezerra de Medeiros, aproximou-se, à
última hora, das forças da oposição,
representadas por João Café Filho
e Kerginaldo Cavalcanti. Depois a sua candidatura
foi afastada pela do Desembargador Elviro Carrilho,
do Tribunal de Apelação carioca,
mas potiguar de nascimento. Saiu triunfante a
facção de José Augusto, elegendo
Rafael Fernandes. O acordo das oposições
foi mantido para as eleições dos
deputados federais e estaduais. Café Filho
veio para a Câmara dos Deputados.
A vitória de Rafael Fernandes colocou a
quantos se congregaram em torno do antigo interventor
na situação de vencidos. A combatividade
desses elementos, que representavam a corrente
pós 30, em oposição aos antigos
políticos que reconquistavam o poder, as
vinculações pessoais de Mário
Câmara com o Presidente Vargas, criaram
a perspectiva de que Rafael Fernandes não
tomaria posse.
A tensão política chegou a tal ponto
que o comandante da Região, Gen. Manuel
Rabelo, deslocou-se de Recife para Natal.
O 21 Batalhão de Caçadores havia
se revoltado em Recife, em 1931. Embora contando
com a simpatia popular, o movimento foi dominado.
Transferiu-se essa unidade para Natal. Veio para
o Recife 29 BC da Capital rio-grandense do norte.
Apesar da troca de sede dos dois batalhões,
revoltaram-se ambos em 1935: um em Recife, o outro
em Natal. O fator insurrecional residia em causas
sociais e políticas.
O levante de Natal foi uma revolta de cabos, sargentos,
operários, funcionários públicos.
A maioria nada sabia de comunismo. Nem mesmo os
dirigentes do movimento, os poucos declaradamente
comunista, tinham formação marxista.
Eram revoltados, simplesmente. O elemento de mais
popularidade, o Sarg. Quintino, da banda de música
do Regimento, não era letrado. Acreditava
apenas que o comunismo solucionaria os problemas
brasileiros. O grosso dos adesistas julgava tratar-se
de um movimento para repor o Interventor Mário
Câmara.
Café Filho, chefe de polícia por
duas vezes, nas interventorias de Irineu Joffily
e Bertino Dutra, observara de perto e reagiria
contra as atividades comunistas:
Fôra-me
dado verificar, então, que eram muito
poucos. Não havia no Rio Grande do Norte
uma economia industrial, capaz de proporcionar
grandes núcleos operários. Por
isso mesmo, a principal célula bolchevista
não era civil, porém militar,
constituída de sargentos, cabos e soldados
do 21 BC¹.
Vargas nomeara para o comando do 21 BC um coronel
gaúcho, de sua inteira confiança,
Otaviano Pinto Soares, o novo comandante procurou
disciplinar a tropa, recentemente envolvida em
arruaças. Abriu inquérito e anunciou
que vários elementos seriam expulsos do
Exército. Inexplicavelmente continuaram
no quartel e nele ainda se encontravam em 23 de
novembro.
O Exército atravessava um período
de inquietação. Pelos regulamentos
militares, os cabos e sargentos eram desligados
após oito anos de serviço ou por
limite de idade. A revolução de
30 fez que esses dispositivos fossem postergados.
Promulgada a Constituição, voltavam
a ser cumpridos. Os cabos e sargentos movimentavam-se
no sentido da revogação da medida.
O novo governador procurava impor sua diretriz
afastando todos os adversários. Na antevéspera
de revolta dissolveu a Guarda Civil criada por
Café Filho, quando chefe de polícia.
Seus homens, que tinham instrução
militar e sabiam manejar armas ficaram descontentes.
Era costume que os presos de bom comportamento
tivessem o privilégio de passar as noites
em casa. No preparo da revolução
os carcereiros, coniventes com a revolta, armaram
esses detentos.
O dia 23 de novembro de 1935 foi um sábado.
Ao meio-dia o comandante e seus oficiais deixaram
a sede do 21 BC. O quartel estava entregue, quase
exclusivamente, aos sargentos, cabos e soldados.
Prenderam logo o oficial-de-dia. Assumiram o comando
da guarnição federal e do 21 BC,
respectivamente, o Sarg. Eliziel Dinis Henrique
e o Cabo Estêvão.
O governador e outras autoridades assistiam a
uma solenidade de formatura, no Teatro Carlos
Gomes. Daí se transportaram, precipitadamente,
para a casa de um amigo, na Rua Sachet. Procurando
melhor abrigo foram para a residência de
um chileno, cônsul-honorário de seu
país. Posteriormente refugiaram-se num
aviso da companhia Latecoère que fazia
a ligação Natal-Dakar, permanecendo
sob a proteção da bandeira francesa.
Depois de se apossarem do quartel, os rebeldes
prenderam o chefe de polícia João
Medeiros.
O Cel. José Otaviano Pinto Soares foi para
o quartel da Força Pública, onde
juntamente com o seu comandante Maj. Luís
Júlio organizou a resistência. O
combate começou às 20 hs. Do dia
23 terminando na manhã seguinte, com o
esgotamento da munição. A oficialidade
legalista foi aprisionada e transportada para
dois vasos de guerra mexicanos, surtos no porto.
Dominada a cidade, fizeram circular em novo jornal,
A Liberdade, impresso nas oficinas da imprensa
oficial que editava A República. Nele foi
publicado o expediente do Governo Revolucionário
Popular e o manifesto ao povo, calcado no programa
da ANL e sob o lema “Todo o poder à
ANL”.
A sede da administração instalou-se
na Vila Cincinato, residência do governador,
hoje Vila Potiguar. Os encargos estavam assim
distribuídos: aprovisionamento –
sapateiro José Praxedes de Andrade; defesa
– Sarg. Quintino Clementino de Barros; interior
– funcionário Lauro Cortez Lago;
viação – estudante João
Galvão; finanças – José
Macedo, funcionário da Agência local
dos Correios e Telégrafos.
Precisavam de dinheiro. Foram à Agência
do Banco do Brasil, cujo gerente se recusou a
atender à requisição de numerário.
Tiveram de arrombar o cofre havia um maçarico
na oficina mecânica de Francisco Brito.
Sabendo para que seria utilizado, o proprietário
recusou-se a entregar o instrumento. Foram às
oficinas do porto, onde conseguiram outro aparelho.
Retiraram cerca de 3.600 conto de réis.
Parte do dinheiro foi distribuída pelo
população. O restante guardado em
Palácio. Na fuga nem todos puderam levar
as importâncias partilhadas. Por precaução,
talvez, em face da perseguição que
sabiam iminente e inevitável preferiram,
deixá-las em poder de amigos e parentes.
Posteriormente, algumas pessoas ricas de Natal
eram apontadas como beneficiárias daquele
dinheiro².
Terminada a revolta, a polícia procurou
recuperar esse dinheiro. Invadiu casas de populares,
obrigando aos familiares a entregarem o que os
chefes, ausentes, tinham escondido. Consta que
vieram três policiais de Recife, Siqueira,
Cisneiros, e Alípio e arrecadaram, para
si mesmos, o que puderam recolher. A derrama de
dinheiro assinalou um surto de progresso. O índice
das construções cresceu assombrosamente.
A população confraternizava com
os rebeldes. Era mais uma festa popular, um carnaval
exaltado, do que uma revolução.
Houve excessos como sempre acontece. Casas comerciais
foram despojadas de víveres, roupas e utensílios
domésticos que aquela gente não
podia comprar. Houve populares que, pela primeira
vez, comeram presunto. Posteriormente falou-se
em violências de todos os matizes. Espalharam
que os revolucionários haviam violentado
as moças da Escola Doméstica, estabelecimento
de alto padrão, criado pelo governo José
Augusto. Os pais das moças e o Bispo Marcolino
Dantas desmentiram tal acusação.
Naquele tempo todo mundo fez o diabo e jogou
a culpa em cima de nós. O povo de Natal
topou a revolução de pura farra.
Saquearam o depósito de material do 21
BC e todos passaram a andar fantasiados de soldado.
Minha primeira providência como “ministro”
foi decretar que o transporte seria gratuito.
O povo se esbaldou de andar de bonde sem pagar.
A República, órgão do governo,
foi rebatizado e passou a chamar-se A Liberdade,
sendo publicado um só número,
que trazia, logo abaixo do título o seguinte:
“Enfim, pelo esforço invencível
dos oprimidos de ontem, pela colaboração
decidida e unânime do povo, legitimamente
representado por soldados, marinheiros, operários
e camponeses, inaugura-se no Brasil a era da
liberdade, sonhada por tantos mártires,
centralizada e corporificada na figura legendária
– onipresente no amor e na confiança
divinatória dos humildes – de Luís
Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança”³.
A revolta instalada no sábado manteve ser
domínio até a quarta-feira. Além
de Natal ocupara as cidades de Ceará-Mirim,
Baixa Verde, São José de Mipibu,
Santa Cruz e Canguaretama. Então já
se sabia da reação em Pernambuco.
Não havia esperança de reforços.
Os rebeldes tinham organizado três colunas.
Uma dirigia-se para Recife, outra para Mossoró.
A terceira embrenhou-se pelo sertão com
destino a Caicó. Esta transportava, num
caminhão, alguns soldados e civis. Um chefe
sertanejo, Dinarte Mariz, que tinha uma frota
de caminhões, organizou sua gente e surpreendeu
o transporte revolucionário na serra do
Doutor, dizimando os seus homens. As outras colunas
não prosseguiram. Seus soldados debandaram
ou foram aprisionados.
Tropas do Exército e das polícias
dos Estados vizinhos ajudaram a restabelecer a
ordem, voltando o governador Rafael Fernandes
para Palácio. Começou a apuração
e a depuração. Os adversários
políticos da situação foram
presos juntamente com os que haviam tomado parte
na revolução. Encheram-se as prisões.
Iniciou-se a remessa de detentos para o Rio. São
os personagens de Graciliano Ramos. Nem os chefes
políticos de renome como Café Filho,
Kerginaldo Cavalcanti escaparam da acusação.
Quem estava contra o Governo era comunista.
^
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Notas:
1
- João Café Filho – Do Sindicato
ao Catete – José Olympio Editora
– págs. 80-81.
2
- João Café Filho – Do Sindicato
ao Catete – Liv. José Olympio Editora
– Rio de Janeiro, 1966 – págs.
80-90.
3
- Depoimento de João Galvão –
in Glauco Carneiro – História das
Revoluções Brasileiras – Edições
O
Cruzeiro – Rio de Janeiro, 1965 –
2º volume – página 419.
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