
A
assunção dos DESCs
A
discussão sobre os DESCs é recente, na trajetória dos direitos
humanos
José Carlos Zanetti
O
tema dos Direitos Humanos por sua amplitude e baixa efetividade, a
despeito dos diplomas, declarações e convenções, dos quais o
Brasil é signatário, permanece como reflexão obrigatória dentro
da CESE a cada informe anual de suas atividades, até porque parte
significativa dos recursos a projetos e das energias dispensadas
no campo do diálogo e das articulações continuam tendo forte
destaque neste campo.
Pode-se
afirmar que 2000 foi verdadeiramente o ano da afirmação dos
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais - os DESCs, no Brasil.
Esta é uma discussão muito recente na trajetória dos DHs,
inclusive no mundo. E há razões históricas muito concretas para
explicar esta tendência esquematizante das “gerações” de
direitos em que, por 5 décadas os Direitos Civis e Políticos
ficaram identificados como a expressão mesma dos Direitos Humanos.
O realce aos Direitos Políticos e Civis estão profundamente impregnados
pela historia recente dos totalitarismos que marcaram a Segunda
Grande Guerra. No caso do Brasil, pelos 21 anos de ditadura militar.
Inspirado
pela Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948,
surge em 196õ o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos
Sociais e Culturais, que ressaltava as conquista coletivas do
mundo do trabalho, da vida em sociedade e dos direitos dos povos. O
Brasil só vai subscrevê-los 26 anos depois, sete após o fim do
regime militar; em 1992. Em 1993, acontece a Conferência Internacional
de Viena que ressalta o caráter universal, indivisível,
interrelacionado e interdependente dos direitos - liberdade e
justiça social -, vistos Como um complexo único e integral.
A
discussão sobre os DESCs no Brasil começou a impor-se de fato sob
o calor dos 50 anos da DUDH. Dois anos antes, em 1996, o Governo
Federal lança seu Programa Nacional de Direitos Humanos,
concentrado nos Direitos Civis e Políticos. Em fins de 97 o
Movimento Nacional de Direitos Humanos em associação com a CPT e a
FIAN dá inicio ao planejamento visando uma nova cultura de DHs para
os grupos, expressos no livreto “Direitos Humanos Econômicos -
Seu Tempo Chegou”. Em 1999, o tema da IV Conferência Nacional de
Direitos Humanos (coordenado pela Comissão de DII da Câmara
Federal em parceria com o MNDH afirmava que “Sem direitos sociais
não há direitos humanos” e nesta mesma ocasião, considerando
a omissão do Governo Federal, lançava o desafio de construir um
Relatório Paralelo sobre os DESCs.
A
metodologia do “relatório paralelo seguiu o modelo do Manual de
Preparação de Informes sobre os Direitos Humanos, das Nações
Unidas. Há mima análise do grau de implementação dos direitos
contemplados no PIDESC (relacionados aos povos indígenas e outras
minorias étnicas, meio ambiente, desenvolvimento sustentável,
discriminação e desigualdades, questões de gênero, situação
agrária, desenvolvimento econômico próprio, trabalho e
sindicalização, previdência social, descanso e lazer, família,
saúde, alimentação e nutrição, criança e adolescente, educação,
cultura e moradia). Para cada um dos direitos há informações
sobre a ordem jurídica, progressos realizados e fatores que
prejudicam o pleno cumprimento das o>brigaçu>es, quer no
campo administrativo, quer no legislativo, tanto por esforço próprio
do país, quanto mediante cooperação e assistência
internacional. Os indicadores utilizados foram produzidos por
instituições oficiais e de elevada credibilidade.
A
produção do relatório envolveu o trabalho voluntário de cerca
de 2.000 mil pessoas, desde a realização de audiências em 17
Estados do Brasil, passando pelo levantamento) rigoroso de dados
oficiais, por discussões metodológicas, pela síntese de volumosas
informações, até chegar a edição e apresentação do documento.
As audiências públicas estaduais foram convocadas e coordenadas
riu conjunto pelas Comissões de Direitos Humanos das Assembléias
Legislativas, seções estaduais da Ordem dos Advogados do Brasil,
Procuradorias Regionais dos Direitos do Cidadão e representações
do Movimento Nacional de Direitos Humanos (que congrega mais de 300
centros espalhados pelo país). E curioso observar, ainda que tenha
sido produzido por um amplo espectro da sociedade civil, teve um
forte interveniência de componentes do estado, como é o caso das
Comissões de Direitos Humanos do legislativo e procuradorias públicas,
nos âmbitos estaduais e federal.
Em
seu documento “Direitos Humanos em Transição”, o deputado Nilmário
Miranda, que já presidiu a CDH da Câmara Federal, traça um
convincente panorama internacional do alcance dos DESCs, já
incorporando as questões ambientais.
“Após décadas
de crescimento, os problemas se agravaram: o desemprego estrutural
estimado em 1,2 bilhões de pessoas, a desintegração das
sociedades africanas, o intolerável trabalho infantil para 300 milhões
de crianças, a superexploração de recursos naturais, as dívidas
externas impagáveis esmagando as nações do Sul, a liberdade
absoluta pelo fluxo de capitais em detrimento de interesses
nacionais e grupos populacionais, entre outros problemas,
representam hoje um legado desse modelo falido.
Com
o fim da polarização entre Leste e Oeste e a emergência dos
efeitos perversos da globalização econômica, principalmente nos
países periféricos, ficou mais evidente que, se não vigirem os
direitos humanos econômicos, sociais e culturais, os próprios avanços
nos direitos civis e políticos ficarão comprometidos, com o
crescimento da violência, da xenofobia, do racismo), da intolerância
e do autoritarismo. Por outro Lado, o crescimento da demanda por
recursos naturais e o dever humano para com nossos descendentes
impulsionaram a consciência ambiental e disseminaram o conceito de
desenvolvimento sustentável, enriquecendo o conceito de direitos
humanos econômicos.
Por
fim, no que toca aos DESCs (ou DESCAs, já contemplando os
direitos ambientais), vale mencionar:
1.
que foi um dos eixos escolhidos como linha de trabalho central
dentro do PAD e que, em parceria com o MNDH, desencadearam oficinas
regionais conjuntas ao longo de 1999 e 2000;
2.
que esta prioridade teve como desdobramento a escolha por parte da
ICCO e do CEDAR – Center for Dignity and Rigthts
(organização holandesa que articula algumas universidades e
outras instituições) de uma oficina sobre o DESCs dentro do Fórum
Social Mundial, em cooperação com o PAD, Plataforma Interamericana
de Direitos Humanos, Democracia e Desenvolvimento (PIDHDD), e MNDH;
3.
que a discussão em torno dos DESCs, vem sendo discutida
recorrentemente dentro da campanha do jubileu 2000, tanto em relação
às Dívidas Sociais (endividamento público X
orçamento), como em relação à Dívida Ecológica,
Direitos
Econômicos
1
- direito à alimentar-se, à moradia e ao trabalho;
2
- direitos trabalhistas;
Direitos
Sociais
3
- direito à segurança social;
4
- direitos das famílias, mães e crianças;
5
- direito à saúde mental e física;
Direitos
Culturais
6
- direito à educação;
7
- direito a participar da vida cultural e do progresso científico;
8
- direito das minorias;
-
Constituem os Direitos Econômicos o direito à alimentação,
de estar livre da fome, o direito a um padrão de vida mínimo, com
vestuário e moradia, o direito ao trabalho e aos direitos
trabalhistas.
-
São Direitos Sociais no Pacto o direito á seguridade social
das famílias, mães, crianças, idosos, os serviços de saúde física
e mental.
-
Por Direitos Culturais entende-se o direito à educação,
de participar da vida cultural e de beneficiar-se do progresso científico,
assim como o direito das minorias étnicas e raciais, de gênero,
orientação sexual etc.”
Direitos
Civis
09
- direito ao reconhecimento e igualdade diante da lei;
10
- direito dos prisioneiros;
11
- direito a um julgamento justo;
12
- direito de ir e vir;
13
- direito à liberdade de opinião;
Direitos
Políticos
14
- liberdade de reunião;
15
- liberdade de associação;
16
- direito i participação na vida política.
O
vínculo recíproco de causa e efeito dos diferentes direitos dentro
dos diferentes grupos e classes dos direitos humanos, e na verdade,
de todo o conjunto desses direitos, é chamado de “interdependência
e indivisibilidade” dos direitos humanos (Conferência de
Viena/93).
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