
I
Colóquio Anual de
Direitos Humanos de São Paulo
PUC/SP
14.5.2001-07-02
A
Concepção Contemporânea de Direitos Humanos:
novas
estratégias para sua efetivação
Paulo Sérgio Pinheiro
(talking
points para exposição oral)
Liberdade do medo
Globalização e Direitos Humanos
Desafios para a sociedade civil
Navigating in uncharted waters
Novos vínculos da sociedade civil
com a esfera estatal
Novas agendas para o Estado democrático
Fortalecer padrões internacionais
Dados e indicadores
Construindo a accountability
Observatórios de Direitos Humanos
em rede
Minhas senhoras,
meus senhores, Caros amigos,
Devo em primeiro
lugar, agradecer à Columbia University, à PUC-SP e à USP, o
apoio à formação do Consórcio Universitário pelos Direitos
Humanos que tornou possível esse I Colóquio.
Professor Oscar
Vieira, meu amigo e colega, que trabalho formidável a preparação
desse Colóquio, com essa programação excelente, assegurada a
participação de mais de uma centena de ativistas de direitos
humanos. Estão de parabéns o ILANUD e a equipe da secretaria do
Consórcio.
Devem ser
agradecidos também, além das três Universidades, a Ford
Foundation, que tem consistentemente apoiado nos últimos trinta
anos a promoção do pensamento crítico na área das ciências
sociais, e a Natura, exemplo de responsabilidade social
empresarial... [com aquela imponente fábrica inaugurada na semana
passada, tenho certeza que esse apoio será repetido no próximo
colóquio].
Quero dedicar
essa minha intervenção nesse Colóquio ao Padre Julio Lancelotti
e aos promotores públicos da infância e juventude agredidos por
funcionários da FEBEM ao acudirem uma rebelião em Franco da
Rocha, em março passado. E também aos estudantes e pesquisadores
selvagemente reprimidos em abril por policiais militares durante
manifestação pacífica contra a ALCA na Avenida Paulista.
Em meados do século
passado, na PUC lá do Rio de Janeiro, graças a meus mentores,
Alceu Amoroso Lima, o Tristão de Athayde e o sociólogo padre
Fernando Bastos de Ávila, hoje na Academia Brasileira de Letras,
li Os Direitos Humanos e a Lei Natural, de Jacques Maritain (Rio,
José Olympio, s.d.), um dos primeiros a introduzir a moderna
concepção dos direitos humanos, a da Declaração de 1948, que
nos inspira até hoje. Maritain comenta que a tensão dinâmica
entre pessoa e a sociedade provoca um movimento horizontal, um
movimento de progresso da própria sociedade evoluindo no tempo:
“Enquanto a pátina
do tempo e a passividade da matéria dissipam e degradam
naturalmente as coisas deste mundo e a energia da história, as
forças peculiares ao espírito e à liberdade, e seu testemunho,
as quais normalmente têm seu ponto de aplicação no esforço de
alguns, - votados por isto ao sacrifício – fazem elevar-se de
mais a mais a qualidade desta energia. A vida das sociedades
humanas avança e progride assim ao preço de muitas perdas, avança
e progride graças a essa elevação de energia da história
devido ao espírito e à liberdade” (p. 44).
Justamente a história
dos direitos humanos é a história das lutas humanas. As pessoas
nascem com direitos básicos mas sua realização não é automática.
A história de que fala Maritain, conta como as pessoas em todo o
mundo tiveram de lutar por seus direitos, com imensos sacrifícios.
As lutas pelas
liberdades humanas transformaram a paisagem da Terra. No início
do século XX apenas 10% dos países eram independentes. No final
do século a maioria viviam em liberdade, fazendo suas próprias
escolhas.
A Declaração
Universal dos Direitos Humanos de 1948 constituiu uma ruptura -
renúncia de uma nova era -
com a comunidade internacional assumindo a realização dos
direitos humanos como uma causa de interesse comum e do interesse
de toda a humanidade. Graças a uma visionária pragmática,
Eleonor Roosevelt, que, presidindo a comissão de redação da
Declaração, criou um dos maiores documentos do século.
A integração
mundial dos países e pessoas foi uma Segunda ruptura – na
medida em que um movimento global integrou os padrões universais
de direitos humanos nas normas de todos os países.
Um sistema
internacional de direitos humanos emergiu durante o último meio século
(em termos do monitoramento, mais precisamente nos últimos trinta
anos, tudo é muito recente). Na Comissão de Direitos Humanos da
ONU em Genebra e no Terceiro Comitê da Assembléia Geral da ONU,
os Estados, Leviatãs modernos, são obrigados a justificar-se
diante de outros Estados ou dos relatores especiais (cujo único
poder é poder relatar) e das organizações da sociedade civil.
No ano de 1990,
se mencionarmos apenas duas Convenções, a Convenção
Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação
Racial e a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminações contra as Mulheres CEDAW, foram ratificadas por
mais de 100 países. Hoje, cinco dos seis principais convênios e
convenções sobre direitos humanos foram ratificados por mais de
140 países. A exceção é a Convenção contra a Tortura. Sete
das principais convenções sobre direitos do trabalho foram
ratificados por 62 países (PNUD, Relatório de Desenvolvimento
Humano 2000, Lisboa, Trivola Editora. 2000. Ver www.undp.org/undp/hdro).
A centralidade
dos direitos humanos foi reiterada nas Conferências
internacionais: a do Rio, sobre meio-ambiente, em 1992 clamou que
“o ser humano é o elemento central do desenvolvimento sustentável.
Tem direitos a uma vida saudável e produtiva em harmonia com a
natureza”. A Conferência de Viena em 1993 dotou o movimento dos
direitos humanos de uma agenda internacional compreensiva para os
direitos humanos, um programa de ação. A declaração de Viena
afirmou alto e bom som que “os direitos humanos são patrimônio
inato de todos os seres humanos e são conceitos que se reforçam
mutuamente”, consagrando sua universalidade, indivisibilidade e
a democracia como requisito essencial para sua realização.
Mas apesar desses
avanços a luta continua. Se o século XX foi a “era de
direitos”, foi igualmente o século do holocausto, do apartheid,
da limpeza étnica, dos genocídios dos armênios, doe Ruanda, do
Burundi, dos estupros em massa na Bósnia, dos etnicídios e da
tortura. Segundo a Anistia Internacional a tortura continua sendo
praticada em 150 países. E também aqui no Brasil, dezesseis anos
depois do final da ditadura militar e de a política de direitos
humanos ser uma política de Estado.
A
indivisibilidade dos direitos humanos foi aceita como um princípio,
subvertendo a divisão dos direitos em dois conjuntos, civil e político
e econômico. Contudo permanece uma tensão e um descompasso
patente entre as garantias dos dois elencos de direitos.
E muitas outras
tensões subsistem, como relembra o Relatório de Desenvolvimento
dos Direitos Humanos 2000, do PNUD:
-
Entre a Universalidade dos direitos e a especificidade
cultural;
-
Entre a soberania nacional e o controle, o monitoramento
internacional dos direitos humanos no interior de cada país;
-
Entre supremacia das leis internacionais e sua implementação.
É no
campo das forças dessas tensões que atuam as organizações da
sociedade civil. A proteção dos direitos humanos, a construção
da paz depois de conflitos armados ou das transições políticas,
o fim da violência endêmica, a resolução dessas tensões
continuam a ser alguns dos principais desafios para a sociedade
civil.
Liberdade do medo
Nenhum
outro aspecto da seguridade humana é tão vital na prática como
na segurança diante da violência física. Tanto nos países
pobres como nas nações ricas do Norte as vidas dos povos são
ameaçadas pela violência civil.
A vida dos povos
está ameaçada pela violência ilegal do Estado, por outros
Estados, por outros grupos de pessoas (conflitos étnicos, crime,
violência urbana, crime organizado e terrorismo), racismo
estrutural e institucional (contra os Afro-descendentes e povos
indígenas), assim como as ameaças dirigidas contra as mulheres e
meninas, jovens e crianças e contra pessoas por sua orientação
sexual. Populações pobres vivem hoje em meio ao crescimento do
crime, da corrupção, da violência e da insegurança.
Faz décadas os
movimentos da sociedade civil mobilizam a opinião pública para
eliminar tais ameaças e ONGs se articulam mundialmente para
fortalecer esses esforços. Na esfera internacional, como já
indicamos, inúmeros instrumentos internacionais protegem os indivíduos.
Mas apesar desse progresso, predomina a incapacidade do Estado,
misto de defensor pacis
e perpetrador mor, de garantir a liberdade do medo para a maioria
da população. Em muitas sociedades, criminosos e agentes do
Estado como as polícias, agem em conluio e esses em vez de serem
os protetores da ordem, são vistos negativamente por sua omissão,
intimidação e brutalização.
Ora, os valores
da democracia e dos direitos humanos não podem prevalecer e se
tornar realidade em comunidades ameaçadas no seu quotidiano por
taxas extremamente altas de mortalidade e arbitrariedades do
agente da lei. Mais do que nunca o Estado deveria focalizar seus
esforços em desempenhar um papel ativo na construção de
comunidades pacíficas.
Globalização e Direitos Humanos
A paz nas
sociedades modernas requer uma atenção especial para as
responsabilidades e deveres das elites nacionais para evitar a
perpetuação da injustiça e dos privilégios de uns poucos.
O chamado a essa
obrigação é especialmente agudo nessa década em que mudanças
econômicas, políticas e sociais maciças isolaram indivíduos e
fragmentaram comunidades em muitas partes do mundo. Para os
pobres, a situação é especialmente desoladora, como ficou claro
no Fórum de Porto Alegre, porque eles têm menos capacidade de se
adaptar a essas transformações.
O crescente fluxo
de comércio, capital e informação contribuiu inegavelmente para
riqueza e oportunidades para muitos. Entretanto, há uma marcada
discrepância entre países com respeito aos ganhos advindos da
expansão do comércio internacional, assim como no acesso ao
investimento internacional direto e a novas tecnologias. Muitos países
mais pobres estão marginalizados dessas oportunidades emergentes.
O abismo entre os países pobres e ricos somente tem aumentado.
A globalização
através da promoção da liberalização do comércio e o aumento
da competição por novos mercados não resultou em ganhos inequívocos
para todos os setores da sociedade. Padrões internacionais de
direitos humanos existem mas não são efetivamente implementados
e adequadamente integrados nas regras que regem o sistema do comércio
internacional.
O número de
trabalhadores migrantes e as vítimas do tráfico internacional de
pessoas cresceu com a intensificação do comércio internacional,
mas esses abusos continuam largamente ignorados. Milhões de
pessoas permanecem excluídas da economia global, forçadas a
aceitar esses termos insatisfatórios. A experiência tem mostrado
que a integração global internacional não pode ser substituto
para um compromisso firme paralelo de defender os direitos
humanos.
Desafios para a sociedade civil
Diante desse
quadro, continuam a ser os principais desafios para a sociedade
civil o fim da violência endêmica e a erradicação da pobreza
– imperativo ético, social, político e econômico da
humanidade. As organizações diante desses desafios se vêem forçados
a encontrar novas estratégias para criar mecanismos viáveis para
a proteção dos direitos humanos.
Ativistas da paz
e dos direitos humanos bravamente confrontaram a violência e a
guerra. As organizações de direitos humanos foram decisivas para
desmantelar os regimes autoritários nesse continente e na Europa
do Leste nos anos oitenta. A educação para os direitos humanos e
para a paz ajudaram-lhes a desenvolver uma clara percepção dos
problemas defrontados.
Navigating in uncharted waters
Entretanto,
muitas organizações entre nós continuam a navegar in uncharted waters, em águas desconhecidas, porque não foram
providos com estratégias específicas para lutar pela paz em
situações de pós-conflito e em sociedades, como a nossa, onde há
um state of no-war and real peace either (facilito o trabalho dos
intérpretes) – estado de não-guerra sem uma pacificação
efetiva. Já é tempo de fazermos face a essa necessidade levando
em conta a especificidade e o pano de fundo histórico de cada
contexto e os obstáculos encontrados na formação de estratégias
apropriadas. Como o não-estado de direito e a inacessibilidade à
justiça para as não-elites, o racismo estrutural e a discriminação
racial, a violência ilegal que assola países depois do fim de
guerras civis e em outras após o retorna da democracia, pensemos
no Brasil e na África do Sul. É também de fundamental importância
identificar com rigor as sérias precariedades do desempenho do
judiciário e as formas pelas quais a impunidade mina o estado de
direito.
Novos vínculos da sociedade civil
com a esfera estatal
Hoje nas
sociedade pós-conflito armado e nos processos de consolidação
democrática requer-se novos vínculos entre as esferas da
sociedade civil e as instituições políticas. Nesse novo
contexto, as organizações se confrontam com desafios inesperados
que vão muito além da mobilização da vergonha, do poder de
embaraçar governos, denúncia, essencial, fundamental, dos abusos
através da documentação e do monitoramento.
Novas agendas para o Estado democrático
As organizações
estão compelidas a intervir na construção de agendas
alternativas para um novo Estado democrático, e para democratizar
as políticas públicas que possam contribuir para um ambiente
capaz de favorecer uma paz sustentável.
Para promover os
direitos humanos e a paz, estratégias precisam ser definidas na
sociedade civil, tanto para construir a consciência a respeito
das graves violações de direitos humanos e para encontrar
criativamente mecanismos para combatê-los localmente. As OSCs
locais em parceria com as agências do Estado, universidades,
centros de pesquisa, igreja tem uma decisiva função no
monitoramento dos direitos humanos.
A participação
dos cidadãos, especialmente os pobres e discriminados, deve ser
facilitada para encorajar a sociedade a expressar suas preocupações
e necessidades, através da sua própria voz, para que sejam
incorporados diferentes pontos de vista nas agendas do governo e
práticas. Para esse objetivo, é essencial criar parcerias, redes
e coalizões, ao nível local, nacional e internacional, na
sociedade civil internacional e no âmbito das Nações Unidas.
Fortalecer padrões internacionais
As OSCs devem se
estabelecer mais eficazmente como monitores da vinculação do
Estado aos padrões internacionais ratificados pela maioria dos países
americanos, promovendo mudanças nas instituições do Estado e
desafiando seu interesse genuíno em defender os direitos humanos.
Ambos, através do suporte à implementação das normas
internacionais e regionais para a proteção dos direitos humanos,
grupos lutando no nível nacional podem ser ampliados e
fortalecidos.
O formidável
trabalho do CEJIL (Center for Justice and Internatinal Law),
fundado por um coletivo de organizações da sociedade civil
latino-americanas, um escritório jurídico em Washington que
prepara as centenas de queixas sobre violações de direitos
humanos para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e para
a Corte Interamericana, é um bom exemplo.
Controle social
de baixo para cima e sistemas de alerta. Mais do que nunca é
necessário encontrar formas de fortalecer a capacidade das
instituições locais para promover o controle social de baixo
para cima. As organizações da sociedade civil também precisam
desenvolver sua capacidade de estabelecer “sistema de alerta
precoce”, early warning systems para prevenir a violência e as
graves violações de direitos humanos.
Dados e indicadores
Educação,
monitoramento e documentação são elementos vitais do processo
de “conhecer e clamar por direitos humanos” como passos necessários
em direção a um desenvolvimento humano sustentável. Comunidades
precisam ser encorajadas a trazer criatividade para esse processo,
recorrendo ao testemunho, reuniões de comunidade, teatro de rua,
arte e fóruns de diálogo informal. Os resultados do
monitoramento e documentação podem então ser coletados e
compartilhados para assegurar a inclusão do pleno espectro dos
direitos humanos individuais e coletivos e prover uma análise
sistemática das violações.
Os dados oficiais
existem, mas eles ficam nos centros de informação dos grandes
centros urbanos. Essa informação não está disponível na
esfera local das comunidades. A população não tem acesso à memória
das condições do passado e não conhece as do presente. Portanto
a informação deve ser democratizada, os dados precisam estar
acessíveis ao nível local.
A democratização
do acesso a dados sobre desenvolvimento humano pode Ter impacto ao
nível local. No Brasil, a disseminação do CD-Rom, pelo IPEA/PNUD,
do “Atlas dos Municípios
no Brasil” pôs ao alcance da comunidade parâmetros para
definição das reivindicações populares.
Construindo a accountability
É vital para a
advocacia de direitos humanos, a criação de mecanismos de
accountability, de obrigar as autoridades e os agentes do estado a
prestarem conta de seus atos públicos e escusos. Nesse respeito,
inúmeras organizações de base tiveram sucesso em mobilizar
recursos e torná-los disponíveis para as comunidades pobres.
Na discussão dos
direitos humanos a criação de instituições de tipo ombudsman
é sempre sugerida como forma de monitorar a ação dos governos e
ajudar a focalizar a opinião pública quanto as mais urgentes e
relevantes questões. Esse é sempre um passo importante.
Entretanto, seria preferível que essas instituições sejam de
preferência combinadas e apoiadas por uma rede mais larga de
grupos de “ombuds” locais, “community ombusmen groups” que
podem construir sua capacidade através do tempo e servir como
promotores e monitores reais e radicais poderão vir a ocorrer.
Observatórios de Direitos Humanos
em rede
Uma das possíveis
estratégias que pretende realizar esses objetivos é o
estabelecimento na América do Sul de uma rede de Observatórios
de Direitos Humanos. Esses observatórios, derivados de uma
proposta do professor Ignacy Sachs estabelecem cooperação
triangular entre universidades e centros de pesquisas, organizações
e instituições do Estado que tem por incumbência a
accountability (como o Ministério Público, os Tribunais de
Contas). Esses observatórios podem também contribuir a fazer
ouvir a própria voz das comunidades mais pobres e desenvolver
indicadores para um elenco de direitos humanos e serem monitorados
e ao mesmo tempo servir como sistemas de alerta para violações.
Uma experiência piloto lançada em maio de 2000, quando da visita
da Alta Comissário de Direitos Humanos, Mary Robinson ao Brasil,
está sendo implantada pelo Instituto Sou da Paz e pela
Universidade de São Paulo junto a grupos de jovens na periferia
de São Paulo.
Quando as políticas
de desenvolvimento e o desempenho do governo são abordados da
perspectiva e experiências dos pobres – fundamento necessário
de qualquer estratégia em direitos humanos – a assistência
para o desenvolvimento e para a luta contra a pobreza, assumem um
conteúdo diferente. O desafio que se coloca para nós todos é
olhar o mundo através dos olhos e do espírito dos pobres, partir
das realidades dos pobres, então dirigir-se para cima e para o
exterior para identificar, e então realizar, as mudanças necessárias
para provocar um impacto positivo na vida das populações pobres
e dos grupos vulneráveis.
Ao pensarmos em
estratégias, não esqueçamos que o que conta não somos nós nem
nossos egos nem brilho pessoal, mas as vítimas das graves violações
de direitos humanos.
Quando estiverem
muito deprimidos, em dúvida, permitam-me propor que “relembrem
o rosto do mais pobre e do mais fraco ser humano que vocês já
viram, e perguntem a si mesmos se o passo que vocês querem dar
será de alguma utilidade para ele. Ganhará ele algo com isso?
Aquilo restaurará nele o controle sobre sua própria vida e
destino? Noutras palavras, contribuirá para conduzir a anatomia
pessoal dos milhões famintos de fome e do espírito? Aí então
vocês verão que suas dúvidas e (a preocupação) com o ego irão
se desvanecer”, eis o talismã proposto por Gandhi.
Antes de
terminar quero registrar que a realização desse colóquio tem
lugar na melhor hora possível. Pouco antes de estarmos reunidos
nessa luminosa manhã, uma choldra de 20 deputados federais (um
suspeito de envolvimento com o narcotráfico, o deputado José
Aleksandro, do Acre) se acovardaram, se venderam e inviabilizaram
a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre corrupção, impedindo
a transparência e a accountability. O patético é que as verbas
públicas que esse bando recebeu do governo federal servirão para
reforçar o clientelismo, favorecendo sua reeleição.
Essa corja fez o
Congresso Nacional se assumir de fato como intimorato protector da
impunidade de senadores, deputados, agentes do Estado e
autoridades desonestas que se apropriam de banco estadual, fraudam
financiamentos oficiais, adulteram concorrências, manipulam
privatizações, violam sigilo constitucional.
Que os céus
iluminem, mas ajudemos pressionando, o digno Senador Saturnino
Braga e a Comissão Ética do Senado para depois desse vexame ao
menos cassarem os mandatos dos senadores Antônio Carlos Magalhães
e José Roberto Arruda por seus atentados ao decoro parlamentar e
ao espírito público.
Resistamos ao
constrangimento, a vergonha, ao abatimento moral que se abateu
essa semana sobre a nação brasileira. Esse Colóquio, a
vitalidade dos participantes, renova a esperança da realização
plena da democracia e dos direitos humanos, a erradicação da
pobreza, da tortura, nesse continente e nesse triste país.
Tenho certeza que
sairemos desse Colóquio fortalecidos para não sucumbirmos ao desânimo
e ao desespero, para combatermos nas trevas (no sentido metafórico
e do apagão que se abaterá sobre nós graças à incúria
governamental).
A luta continua,
sempre.
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