
SDDH
Se Mantém no Julgamento do Eldorado
Mais um laudo do vídeo
feito durante o massacre de Eldorado dos Carajás confirma que a Polícia
Militar foi quem atirou primeiro nos trabalhadores rurais sem-terra, no
dia 17 de abril de 1996, no local conhecido como Curva do “S” da
rodovia PA 150, no sul do Pará, por vota das 17h. O laudo foi
apresentado pelo perito Joaquim Batista Freitas de Araújo, diretor do
Instituto Médico Legal Renato Chaves, de Belém, em depoimento prestado
ontem à tarde, durante a primeira sessão do Tribunal do Júri do
segundo julgamento dos militares envolvidos na operação e que está
sendo realizado no plenário do Tribunal de Justiça do Estado do Pará.
Os advogados da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos –
SDDH, representando familiares da vítima Graciano de Souza, foram os únicos
a permanecer atuando na assistência da promotoria depois da retirada do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST do julgamento.
O perito Joaquim de Araújo
digitalizou as imagens gravadas pelo cinegrafista da TV Floresta, de
Tucuruí, Raimundo Oswaldo dos Anjos Araújo, para analisar
detalhadamente quadro a quadro as cenas gravadas. Ele concluiu que foram
as tropas da Polícia Militar do Pará que iniciaram o conflito jogando
bombas de gás lacrimogêneo e atirando sobre os cerca de mil
manifestantes que se encontravam na rodovia. Antes da reação dos
sem-terra, que partiram depois para cima da tropa, dois integrantes do
MST já haviam sido mortos ou feridos e seus corpos encontravam-se
estendidos no chão. O perito mostrou ainda que pelo menos um policial
militar estava sem a tarja de identificação no uniforme e que dentro
do ônibus que conduziu as tropas de Marabá para Eldorado dos Carajás
havia uma caixa de munição da PM.
O motorista do ônibus, Pedro
Aníbal da Silva, confirmou que os soldados entravam no ônibus para
recarregar suas armas e saiam levando munição da caixa. Em seu segundo
depoimento à Justiça, o motorista voltou a contradizer o coronel Mário
Colares Pantoja confirmando que ele disse para a tropa, na volta para
Marabá: “Missão cumprida, ninguém viu nada, todos calados”. O
coronel tinha negado que tivesse dito a frase em depoimento pouco antes
do depoimento do motorista. O motorista também confirmou que recebeu
ameaças de morte depois do conflito.
Os advogados da SDDH,
Marcelo Freitas, Hernandes Margalho, Marco Apolo Leão e Janaína Albuquerque, aproveitaram a presença dos peritos
para mostrar mais uma vez que a vítima Graciano de Souza foi executada,
junto com a maioria das outras vítimas, a partir das análises dos
exames realizados nos cadáveres e das perícias das armas e objetos
encontrados durante o conflito, incluindo um boné da Polícia Militar.
A maioria dos mortos sofreu ferimentos na cabeça. Os advogados que
atuam na assistência, ajudaram também a promotoria em todos os
momentos da primeira sessão do julgamento, interrogando os depoentes e
ajudando no esclarecimento dos laudos anexados ao processo, incluindo o
apresentado pelo diretor do IML. A SDDH decidiu permanecer no julgamento
mesmo depois da retirada dos advogados do MST.
Iniciada com um
atraso de cerca de duas horas, a primeira sessão, que julgará os três
oficiais que comandaram a operação militar, foi desmembrada a pedido
do advogado de defesa do major José Maria Oliveira que será julgado em
separado em sessão marcada para o dia 21/05. Sentaram no banco dos réus,
ontem o coronel Mário Colares Pantoja e o capitão Raimundo Almendra
Lameira. Em seus depoimentos ao juiz
Roberto Moura, que preside o julgamento, O coronel Pantoja voltou
a acusar o governador Almir Gabriel e o então comandante da PM do Pará,
coronel Fabiano Lopes de serem os responsáveis pelo massacre alegando
que tentou de mover o comandante da PM do envio das tropas para Eldorado
dos Carajás e que solicitou a tropo de choque para a missão, tendo
ouvido como resposta do seu superior a seguinte frase, antecedida de
palavrôes: “ Vai fazer que ele (governador) já está chateado com o
MST”. Os oficiais tentaram se livrar da acusação de toda maneira.
Pantoja alegou que estava desarmado e o capitão Lameira disse que,
apesar de estar armado com uma metralhadora, “atirou para cima”.
A primeira sessão
do julgamento foi suspensa às 22h15 depois do depoimento do
cinegrafista Raimundo Oswaldo dos Anjos Araújo que disse que as tropas
fizeram um “sanduíche” cercando os sem-terra
pelos dois lados. Ele disse ainda que viu pelo menos uma pessoa
sem farda no meio da tropa portando uma metralhadora e que foi essa
pessoa quem inclusive obrigou o cinegrafista e a repórter da TV
Liberal, Marisa Romão, a entrarem num ônibus onde policiais lhe
tomaram a câmara e confiscaram a fita de vídeo que havia gravado e que
só no dia seguinte foi devolvida.
Ontem também foi
reproduzido o depoimento do governador Almir Gabriel, dado ao juíz
Ronaldo Vale, durante o primeiro julgamento, em 1999, que resultou na
absolvição dos oficiais militares que comandaram a operação, anulado
pelo Superior Tribunal de Justiça. Os últimos depoimentos de ontem
foram acompanhados por representantes da Comissão Pastoral da Terra.-
CPT, entre eles os advogados Jerônimo Trecani e o padre de Xinguara e
advogado, Henry des Rosé. Humberto Spíndola, representante da
Secretaria de Direitos Humanos, também acompanhou a sessão de ontem.
O julgamento
continua hoje com a participação dos peritos Ricardo Molina e Bandan
Palhares que também examinaram a fita gravada do conflito chegando a
conclusões opostas. Molina também prova que foram os policiais que
iniciaram o conflito, ao contrário de Palhares que sustenta versão
diferente que beneficia os policiais. Somente hoje devem ser iniciados
os debates entre acusação e defesa.
Raimundo
Sena
Jornalista
Reg.
DRT/PA n º 1277
9982-1548
|