
CENTRO
DE DIREITOS HUMANOS E MEMÓRIA POPULAR
Filiado ao Movimento Nacional de Direitos
Humanos
“DOCUMENTO
DE NATAL”
RESOLUÇÕES DO SEMINÁRIO SOBRE:
“POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO E DIREITOS
HUMANOS”
POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO
E DIREITOS HUMANOS
Natal, 26 a 28 de Novembro
de 1992
DOCUMENTO DE NATAL:
Compreender
a Comunicação como um processo estratégico cada vez
mais fundamental na sociedade contemporânea e intervir
politicamente, de forma planejada, nesse processo, com
vistas a uma informação democrática. Este é um desafio
urgente para o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH),
de acordo com as conclusões do Documento de Natal,
aprovado pelos participantes do Seminário sobre Política
de Comunicação e Direitos Humanos, realizado no
Instituto de Teologia Pastoral de Natal (RN), Itepan, de
26 a 28 de novembro de 1992. atuaram como assessores os
jornalistas Dermi Azevedo, Secretário de Comunicação do
MNDH e Ivan Seixas, da Agência Ecumênica de Notícias.
O
Seminário foi promovido pelo Movimento Nacional de
Direitos Humanos, através de seu Programa de Comunicação,
com apoio de Centro de Direitos Humanos e Memória Popular
de Natal.
A
seguir, a íntegra do Documento de Natal:
“Reunidos
em Natal (RN), de 26 a 28 de novembro de 1992, para reflexão
e análise do tema “Política de Comunicação e
Direitos Humanos”, nós militantes e representantes de
organismos de direitos humanos do Regional Nordeste do
Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH),
compartilhamos, neste Documento de Natal, com os
companheiros de luta, as nossas conclusões, preocupações
sobre este tema e seus conseqüentes desafios:
1º Momento:
ELEMENTOS
A SEREM INCLUÍDOS NUMA POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO EM
SENTIDO AMPLO, A NÍVEL LOCAL, NACIONAL E INTERNACIONAL:
Nessa
formulação, foi constante a preocupação sobre o que é
Política de Comunicação nos três níveis. Partindo das
nossas experiências chegamos a apontar os seguintes
elementos:
a)
Encarar a comunicação como uma Política Pública;
b)
Fortalecer nossas relações com as diversas
entidades e órgãos que trabalham com a questão dos
Direitos Humanos, na perspectiva de melhor qualificar
nossas ações conjuntas;
c)
Refletir a comunicação com ato político;
d)
Qualificar nosso entendimento sobre a política de
comunicação, e não reduzi-la apenas a instrumentos
(fax, computadores, vídeos, filmadoras etc.);
e)
Fortalecer o Fórum pela Democratização da
Informação contribuindo com a apresentação de novas
propostas e promovendo estudo dos documentos já
produzidos;
f)
Apoiar o trabalho de agências nacionais e
internacionais de notícias alternativas;
g)
Ampliar e conquistar mais espaços na mídia, com
base na convicção de que nossa comunicação não pode
limitar-se ao âmbito interno do MNDH;
h)
Abrir espaÇos para as diversas formas de
abordagens de um mesmo tema, evitando a auto-suficiência
do “temos a verdade absoluta” e fortalecendo o
pluralismo;
i)
Discutir a ética e a estética do Jornalismo, em
particular e da Comunicação, de modo mais amplo
enfatizando a ética dos comunicadores;
j)
Incluir, também, nesta reflexão, a análise sobre
os aspectos estéticos da Comunicação;
k)
Criar alternativas à crescente monopolização e
oligopolização dos meios de comunicação de massa,
através de políticas públicas democráticas e
participativas neste campo.
2º Momento:
O que dificulta:
1)
A concepção instrumentalista da informação e da
comunicação (infocom). Ênfase somente nos meios de
comunicação e não no processo.
2)
Atuação desorganizada e não planejada nesse campo.
3)
Atuação limitada ao gueto específico. Identificar a
comunicação com meios limitados, artesanais e pontuais.
Mal trabalhados. Há postura do “nós falamos só para nós”.
Deixar de pensar na comunicação massiva.
4)
Falta de uma política de capacitação e formação.
5)
Práticas verticalistas e autoritárias de informação/comunicação
em nosso próprio campo. Vigência do modelo tradicional
Emissor/Receptor e não da relação entre sujeitos.
6)
Uma visão limitada sobre cultura, confundida com
folclore.
7)
Um trabalho que não considera o acúmulo das lutas e sua
memória.
8)
A reprodução em nossas publicações da idolatria do
fato: desconsideração das causas e o contexto, ou, então,
a reprodução da idolatria da causalidade (somente análises
e explicações, sem fatos).
9)
A não vinculação entre o fato abordado e o processo que
o envolve. Por exemplo: a fome é o processo e alguém que
morreu de fome, o fato ligado à fome.
10)
A concepção da informação como uma mercadoria e não
como um bem social.
11)
Concepções estereotipadas, sectárias e/ou discriminatórias
no trabalho e na produção informativa.
12)
A forma como trabalhamos nosso conteúdo (do MNDH) é polêmica
e, quase sempre confundida com a “defesa de bandidos”.
Segundo um dos participantes do Seminário, “os direitos
humanos são um bom produto. O problema é que está sendo
mal vendido, mal explorado em termos de marketing”.
Há
consenso em afirmar que o MNDH só dará um salto
qualitativo na área de comunicação no momento em que
entendê-lo como um direito básico – individual e
coletivo – e, como objeto de uma proposta específica de
política pública a ser defendida, juntamente com todas
as demais políticas públicas.
O que ajuda:
1.
Compreender a informação e a comunicação como
dados básicos a serem trabalhados na vida em sociedade.
2.
aprofundar a visão estratégica da comunicação.
3.
compreender a informação e a comunicação como o
direito de comunicar e de receber informação.
4.
desenvolver uma tática de trabalho, dentro da visão
estratégica de comunicação.
5.
promover uma atuação aberta para a sociedade
abrangente, baseada na política de alianças (articulações).
Ex.: Fórum pela Democratização da Informação, no
Congresso Nacional e noutras áreas.
6.
capacitação e formação permanentes nesse campo.
7.
análise contínua da realidade e da conjuntura
para dar base à uma ação política eficaz.
8.
fazer aprendendo e aprender fazendo.
9.
compreender claramente a cultura popular como
primeiro e básico espaço de encontro da identidade
pessoal, grupal e comunitária. Identificar, na cultura
popular, os aspectos que refletem a cultura dominante
(aspectos reflexos) e os aspectos potencialmente
transformadores.
3º Momento:
ANÁLISE
DA CONJUNTURA E O PAPEL DO MNDH
EM
TERMOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL:
Neste
momento, os participantes do Seminário analisaram em
grupo, a conjuntura brasileira, de modo prospectivo, a
curto, a médio e a longo prazo, priorizando os elementos
da realidade em quatro blocos: econômico, político,
social e cultural.
Econômico:
1.
Reformas econômicas (fiscal e monetária);
2.
Processo de privatizações;
3.
Mercado Comum do Cone Sul (Mercosul);
4.
Abertura de mercado no Brasil, a começar pelo da
informática.
Político:
1.
Impeachment de Collor e suas conseqüências;
2.
Novas administrações municipais;
3.
Plebiscito de 21 de Abril de 1993;
4.
Reforma ministerial do governo Itamar Franco;
5.
Reforma partidária;
6.
Separatismo (movimento neste sentido no país);
7.
Eleições Gerais em 94 (exceto prefeitos e
vereadores);
8.
Rearticulação da direita.
Social:
1.
Violência;
2.
Migrações.
Cultural:
1.
Conflitos separatistas;
2.
Violência racial;
3.
Questão Indígena;
4.
Significado psicossocial das eliminatórias para a
Copa do Mundo.
NOSSAS
PROPOSTAS DE ATUAÇÃO DIANTE
DESTA
REALIDADE CONJUNTURAL:
1.
NO
PLANO ECONÔMICO:
Meta:
Problematizar
esses temas em nossas publicações, reflexões e outras
atividades.
Outras
pistas:
Socializar
a discussão sobre o Mercosul. Não encará-lo apenas como
assunto específico da Região Sul, mas vê-lo no contexto
mais amplo de inserção do Brasil na atual fase da
economia capitalista. Verificar o que há parecido com o
Mercosul em cada região do país.
Meta:
Aprofundar
e ampliar a parceria entre o MNDH e o movimento sindical
na perspectiva de trabalhar o eixo do Movimento, dentro de
novas formas de expressão cultural.
2.
NO
PLANO POLÍTICO:
Duas
propostas são vistas como prioritárias:
2.1
– Diante
do Plebiscito de 21 de abril de 1993 e da revisão
constitucional:
Aprofundamento
do tema, a partir de janeiro/93, complementado com amplas
discussões e pressões populares.
Instrumentos
a serem utilizados:
Vídeos,
Programas
de rádios,
Espaços
em televisão,
Peças
de teatro, etc.
2.2
– Novas
administrações:
Apresentação
de propostas nas novas administrações na área de
Direitos Humanos. Prazo: março de 1993.
3.
NO
PLANO SOCIAL:
Meta:
1
– Externar nossa posição dentro e fora do MNDH sobre
esse campo;
2
– Ocupar os espaços abertos pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente;
3
– Defender a unificação das propostas na área da
criança e do adolescente.
Prazo: 1º semestre de 93.
Estratégias:
1
– Ouvir e consultar as entidades filiadas, que trabalham
nesse campo;
2
– Estabelecer uma política de alianças com vistas a
ocupação de espaços;
3
– Produzir audiovisuais que externem nossa posição com
base na experiência de nossas comunidades. Experiência
das nossas entidades;
4
– Promover debates, seminários e fóruns, ocupando
sempre espaços na mídia.
Violência Policial:
Metas:
1
– Campanha publicitária mostrando que os policiais são
as primeiras vítimas de violência de que são agentes,
denunciando também as deformações no processo de
profissionalização por que passam;
2
– Campanha publicitária mostrando os Direitos Humanos
como a base da paz social e da segurança da sociedade
como um todo.
Estratégias:
Parceria
com as entidades ligadas ao trabalho com a violência.
Aproveitamento
dos espaços da Campanha da Fraternidade/1993.
4.
NO
PLANO CULTURAL:
Metas:
1
– O seminário foi uma oportunidade positiva de absorver
mais informações;
2
– Foi um marco importante que precisa ter continuidade;
3
– É uma pena que o nosso regional não tenha parado
para sistematizar as experiências na área da comunicação
como fez nas áreas da violência e da formação;
4
– O seminário veio possibilitar uma nova concepção do
que venha a ser o processo de comunicação, estratégico
e decisivo em qualquer trabalho de transformação social,
político, econômico e cultural;
5
– Com toda simplicidade deste evento, devemos encará-lo
como um marco na história do Movimento. Até então,
todas as experiências têm sido em torno do trabalho com
instrumentos de comunicação e nunca como base numa visão
política mais ampla, isto é, pensando numa política de
comunicação; isto significa ainda uma superação de uma
resistência contra a discussão deste tema, dentro do próprio
Regional;
6
– Um primeiro sinal positivo para transformar em prática
o que se discutiu no seminário é a produção de um vídeo
– em regime de parceria – envolvendo o Centro de
Direitos Humanos e Memória Popular de Natal (RN) e o
Serviço Comunitário de Justiça e Paz, de Recife (PE),
ambos do Regional Nordeste do Brasil.
7
– Constata-se a dificuldade dos CDHs que não lidam
diretamente com a questão da comunicação, de debater a
política de Comunicação. No entanto, o debate é um
primeiro passo importante para enfrentar essa dificuldade.
Conclusão:
Este
documento resume as preocupações e contribuições do
seminário sobre: Política de Comunicação e Direitos
Humanos. O Regional Nordeste sugere e propõe aos outros
sete regionais do MNDH e às entidades filiadas que dêem
continuidade a este trabalho e aprofundem essas reflexões.
Somente assim, de forma continuada e em regime de mutirão,
definiremos, grupal e coletivamente, a Política de
Comunicação que pretendemos para o nosso movimento e
contribuiremos também para que os movimentos sociais e
populares brasileiros tracem uma Política de Comunicação
para o Brasil. Uma política baseada na democracia e na
participação.
Natal (RN), 28 de novembro de 1992.
REGIONAL NORDESTE/MNDH
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