
Expiação
ou Purgação Canônica
Directorium
Inquisitorum
Aqui,
fica definido como se deve concluir o processo de alguém que, na
sua cidade ou região, tem fama de herege, mas de quem não se pôde
provar suficientemente o delito, nem através da confissão, nem
de provas materiais ou dos depoimentos das testemunhas. Um caso
como esse só pode ser calúnia.
Nestas situações, não pode pronunicar uma sentença definitiva,
nem de absolvição, nem tampouco de condenação. Por isso, o
inquisidor e o bispo, juntos, irão lavrar uma sentença nos
seguites termos:
"Nós,
Fulano de Tal, pela misericórdia divina, bispo de ..., e, Nós,
Fulano de Tal, dominicano, inquisidor etc.
Considerando
que a conclusão do processo que abrimos contra ti, Fulano de Tal
etc., que foste denunciado como herege, e particularmente etc, que
não conseguimos obter a tua confissão, e que não pudemos
indiciar-te no crime de que te acusam, nem de outros crimes, mas
que, ao que parece, foste realmente 'difamado' como herege aos
olhos dos bons como dos maus, na cidade tal, na diocese tal;
Nós
te aplicaremos, como manda a lei, uma pena canônica como expiação
da tua infâmia.
Nós
te intimamos a comparecer, pessoalmente, para fazeres a expiação,
em tal dia, do mês tal, a tal hora. Os 'co-expiadores'
que te acompanharem devem ter uma integridade navida e
na fé notórias, devem conhecer os teus hábitos e a tua vida, e,
sobretudo, o teu passado. Notificamos que, se fraquejares durante
o cumprimento da pena, serás indiciado como herege, de acordo com
o que está estabelecido nos cânones."
Aqui,
cabe explicar que a expiação é feita diante de sete, dez, vinte
ou trinta (menos, em alguns casos, mais em outros) "co-expiadores"
que serão do mesmo nível do acusado: religioso, se ele for
religioso; padre, se for padre; soldado, ser for soldado etc.
Todos devem ser capazes de dar testemunho sobre a fé atual e
pregressa do acusado.
Se
o "difamado" não puder cumprir a expiação, será
excomungado. E, se ficar um ano nesta situação, será condenado
como herege.
Se quiser cumprir a expiação mas não conseguir juntar o número
de co-expiadores prescrito pelo inquisidor, será ipso facto
considerado como herege e condenado como tal.
No entanto, em alguns casos, os "co-expiadores" podem
ser de posição inferior à do acusado: por exemplo, para um
bispo "caluniado", os co-expiadores poderão ser abades
ou, simplesmente padres; se o "caluniado" é um rei, os
co-expiadores poderão ser nobres, cavaleiros, etc. [...]
A
purgação canônica deve ser levada a efeito no local em que
surgiu a calúnia. Deve ser repetida em todas as regiões ou países
em que essa pessoa andou ou ainda é alvo de comentários.
Todo
caluniado que sofre "purgação", se cair, mais tarde,
na heresia que expiou, será considerado relapso, e, como tal, será
entregue ao braço secular."
Le
Manuel des Inquisiteurs, Manaual dos Inquisidores (Directorium
Inquisitorum), Nicolau Eymerich, 1376 revisto por Fco. de La Peña,
1578. Traduzido para o francês em 1973 por Louis Sala-Moulins.
|